domingo, 17 de abril de 2011

Rádio Favela - Uma Onda no Ar

UMA ONDA NO AR

Jeniffer Nina das Neves

Leira Salete Teixeira de Souza

Voz do Brasil

Desde 1931, com o Departamento Oficial de Publicidade, substituído em 1934 pelo Departamento de Propaganda e Difusão Cultural (DPDC), o governo já vinha implantando uma política de controle da informação transmitida pelo rádio e pela imprensa. Quando o DPCD se transformou no Departamento Nacional de Propaganda (DNP), em 1938, inaugurou-se o programa “Voz do Brasil”, transmitido diariamente por todas as estações de rádio, com duração de uma hora, visando à divulgação dos principais, na ótica governamental, acontecimentos da vida nacional.

A partir de 1939, a “Voz do Brasil” passou a ser feita pelo DIP, que tomou o lugar do DNP. O programa se destinava a cumprir três finalidades: informativa, cultural e cívica. Além de informar detalhadamente sobre os atos do presidente da República e as realizações do Estado, a “Voz do Brasil” incluía uma programação cultural que pretendia incentivar o gosto pela “boa música”, através da audição de autores célebres. A música brasileira era privilegiada, já que 70% do acervo eram de compositores nacionais. Comentários sobre a arte popular, em suas mais variadas expressões regionais, e descrições dos pontos turísticos do país também eram incluídos na programação. Quanto à parte cívica, era composta de “recordações do passado”, em que se exaltavam os feitos da nacionalidade. Nas peças de radioteatro, para as quais eram convidados os mais destacados dramaturgos da época, como Joraci Camargo, enfocavam-se dramas históricos, como a retirada de Laguna, a abolição da escravidão e a proclamação da República.

Contextualização

“Uma Onda no Ar” é a história da criação e do desenvolvimento da Rádio Favela, de Belo Horizonte – “a voz livre do morro”, como a chamavam seus idealizadores. A rádio pirata entrava no ar todos os dias no horário do programa estatal A Voz do Brasil. A tática e o amplo alcance dos transmissores da rádio, que mandavam suas ondas bem além da favela, incomodavam as autoridades. Jorge, um dos idealizadores da rádio, negro e morador da favela, acaba sendo perseguido e preso pela polícia. Atrás das grades, é questionado por outro detento sobre como foi a criação da Rádio. Começa a contar uma história de luta, resistência cultural e política contra o racismo e a opressão social, em que a população da favela encontra uma importante arma: a comunicação.

As músicas escolhidas para o filme mostram uma atenção especial da rádio em valorizar a diversidade da cultural afro na América e sua força como mecanismo de protesto. Quem assiste o filme pode apreciar desde o rap nacional dos Racionais MCs, passando pelo break, o samba, o blues, o funk, a música da gente dos morros, até o berimbau da capoeira. As descontinuidades temporais de algumas cenas são marcadas por músicas que também tem o papel de estabelecer conexão entre diferentes universos tratados no filme: a política, a polícia, a favela, a escola, a rádio e o crime.

A Rádio Favela desempenha importantes papéis como, por exemplo, o de promover a comunicação dentro e fora da favela. As vozes de protesto aparecem de maneira bem direta, pedindo mais verbas para geração de empregos, melhorias nas escolas e menos dinheiro para armar a polícia. Essa programação, “afinada” com a população excluída, aparece nas falas dos locutores como expressão do descontentamento com as condições de vida da população pobre. A utilização desse meio de comunicação para se promover mudanças positivas rendeu um prêmio das Nações Unidas à Rádio Favela, pelo seu papel educativo e de prevenção ao uso e tráfico de drogras.

O racismo é mostrado em diferentes espaços. Um dos epísódios mais marcantes de discriminação racial acontece na escola. Jorge tinha uma bolsa para estudar num colégio da elite de Belo Horizonte, pois sua mãe era a faxineira da escola. Durante a apresentação de um seminário sobre a libertação dos escravos, os alunos afirmam que a Lei Áurea teria resolvido de forma definitiva a questão do negro na história do país. Ele discorda, dizendo que a Lei Áurea não representou definitivamente a liberdade para o negro, questionando a situação dos descendentes dos escravos no atual contexto.

O desenrolar desse episódio, ao mesmo tempo em que despertou raiva, estimulou o rapaz a refletir sobre sua luta. O racismo, mascarado pela idéia de que no Brasil não existe discriminação racial, e a condição de exclusão social, da qual ainda partilha boa parte da população negra, foram alguns dos principais motivos que estimularam a criação da rádio.

A possibilidade do cinema interferir na construção da identidade do negro, devido à visibilidade que este veículo proporciona, tem gerado importantes discussões sobre produções que abordam a questão.

A partir dos anos 1960, a ditadura militar brasileira inviabilizou todas as manifestações de cunho racial. Os militares transformaram o mito da “democracia racial” em peça chave da sua propaganda oficial e tacharam os militantes (e mesmo artistas) que insistiam em levantar o tema da discriminação como “impatrióticos”, “racistas” e “imitadores baratos” dos ativistas estadounidenses que lutavam pelos direitos civis. Durante as décadas de 1970 e 1980, os afro-brasileiros que impregnaram suas atividades expressivas de um protesto e uma condenação explícitos da situação dos negros na sociedade brasileira foram frequentemente censurados, em termos formais ou informais, por elites que viam tais acusações como uma afronta ao caráter nacional.

As cenas escolhidas, que mostram a discriminação e a luta dos militantes pela causa foram primeiramente a criação da rádio, o preconceito na escola sofrido pelo protagonista do filme, o momento em que a rádio vai pela primeira vez ao ar, criticando a Voz do Brasil, a primeira prisão de Jorge, quando foi questionado sobre o preconceito no Brasil pelo delegado, a valorização da cultura através da música afro e da dança, e as cenas finais onde aparecem a crítica à polícia e algumas manifestações dos moradores da favela. O filme, com excelente elenco e muito bem produzido, mostra a discriminação no Brasil na década de 80 e a luta dos militantes negros para o exercício da cidadania, um direito constitucional.

Dados sobre o filme:

Gênero: Drama

Classificação etária: 14 anos

Tempo de duração: 92 minutos

Ano lançamento: 2002

Elenco:
Alexandre Moreno .... Jorge
Adolfo Moura .... Zequiel
Babu Santana .... Roque
Benjamin Abras .... Brau
Edyr Duqui .... Dona Neusa
Priscila Dias .... Fátima
Renata Otto .... Lídia

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